Tenho contado muitas histórias em que me estrepo (as campeãs
de audiência), mas não trago nenhum trauma ou ressentimento, era feliz, acreditem. Mas..., essa história..., eu confesso, é dolorosa, nem gosto muito de lembra-la, mas,
pelos registros históricos... vai lá. Quando moleque fiz muitas coisas para
ganhar dinheiro, mas sem obrigações ou necessidade de sobrevivência, fazia
porque gostava de trabalhar, nunca precisei ajudar em casa e meus pais nunca
pediram nada, éramos pobres, mas todos ao nosso redor também o eram e não nos
faltava nada (o padrão da época era: comer, beber e vestir. Ponto). Hoje? Sem
comentários. Portando essas histórias que para uns e outros são tristes, para
mim não. Essa, como já disse, é diferente. Bem, vamos lá, Sempre trabalhei,
e uma das atividades que eu fiz foi vender linguiça. Isso mesmo, linguiça, e de
porta em porta, nas casas. Tudo começava acordando a 4:00 da manhã, pegava dois
ônibus e ia até a fabrica de linguiças. Tinha de chegar cedo, se não elas acabavam e
a viagem era em vão, pois eram muitos os vendedores de linguiça como eu e se
formava uma grande fila de interessados quando ainda estava escuro. Algumas vezes isso
aconteceu, mas quase sempre conseguia meus 20 quilos de linguiça e embutidos, como
lombinho e costelinha, mas o forte era linguiça, tipo 15 de linguiça e 5 dos
demais produtos. Comprava, pagava e começava o meu sofrimento, carregar aquele
peso. Minhas mãos ardiam, nas alças da bolsa de pano que minha mãe tinha feito
para mim. Pegava o primeiro, depois o segundo ônibus e ia à luta, vender. Voltava
para o bairro onde morava e ia, de porta em porta, batendo palmas e oferecendo
meus produtos, não era fácil. Lembro que as linguiças vinham embaladas em sacos
plásticos de 1 quilo, mas nem todos podiam comprar um quilo inteiro e eu tinha
que dividir o saco de um quilo em duas ou até em três partes. Usava uma “balança
de peixeiro” para fazer esse trabalho, mais o que valia mesmo era o olho, vamos
chamar de “balançolho. O local que eu mais vendia era a favela “do Gato”, onde
ficava a Praia da Magata, que foi destruída por uma rodovia e depois por um
estaleiro (vide historia XXIII). Lá ia eu, gritando pelas vielas: “olha a
linguiça” e, como disse, batendo de porta em porta, ouvindo muitos e muitos nãos
até conseguir concluir minha venda. Essa luta eu tive por 6 longos, muito
longos, meses até que consegui um novo emprego. Lá eu ia usar minha habilidade,
adquirida num duro e longo curso: datilografia. Era uma editora, lá pude
utilizar então minhas habilidades de datilógrafo e fazer uma atividade
diferente, mas era muito, muito longe e o salário não era grande coisa, fora
que eu estudava à noite, vinha dormindo em pé no ônibus, que raramente aparecia,
tinha dia de espera-lo por duas horas e quando chegava estava entupido, difícil
de entrar e depois que entrava não pode tirar o pé do chão, se não não
conseguia mais coloca-lo e tinha de vir num pé só, tipo saci-pererê. Uma vez conversava com uma
pessoa que trabalhava nessa editora e falei da minha última atividade e quanto
ganhava. O, para mim, sem noção me questionou
porque eu não continuava vendendo linguiças, visto que eu conseguia ganhar mais
dinheiro que no escritório? Ia tentar responder, mas ele não entenderia.
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