23 março 2012

Short Story XXXII - Bicicleta


Era amigo da minha mãe, sempre gostei de estar com ela, conversar e estarmos junto. Lembro uma vez que meu pai nos viu juntos conversando e falou: “que tanto conversam aí? Posso participar?” Acho que rolou um certo ciúme... Cuidei dela até falecer, comprando os remédios, fazendo supermercado, visitando-a e ouvindo a sua musiquinha de despedida: Quem parte leva saudade de alguém, e fica chorando de dor. Ai, ai, ai, ai... tá chegando a hora..., meus filhos lembram até hoje. Resumindo, era o filhinho da mamãe, amigo e companheiro, sempre junto, ajudando nos afazeres domésticos, que não eram poucos e cuidando da casa quando ela saía, fazendo gororobas que fizeram surgir um dos meus mais famosos bordões, “melhor comer isso que morrer de fome!”. Quando estava por volta dos meus 14 anos, as coisas começaram a  melhorar, visto que alguns irmão já haviam casado e saído de casa e eu ganhei a minha primeira e única bicicleta da minha vida. Minha mão comprou na antiga Mesbla, que nem existe mais há muito tempo, e foi comprada em suaves prestações, exatamente 12 parcelas. Ela era linda, uma Monark barra forte, aquela que tem uma bola de ferro no meio do quadro e eu a adorava. Lavava, encerava, passava óleo, cuidava como um filho querido, era o meu nirvana da felicidade e realização. Andava para cima e para baixa, com aquele gostoso pneu balão e fui muitas e muitas vezes do Paraiso até o Jockey (isso só sabe quem é de Saint Gangôlo, balneário ao fundo da baia da Guanabara), distante um 20 ou 30 km, não faço ideia, mas eu fazia em cerca de uma hora. Eu tinha amigos que moravam lá e sempre ia para aquelas bandas para tomar banho num açude que havia naquela região, nos seus rios fétidos e poluídos de esgoto, mas o principal, sem dúvida alguma, eram as pessoas. Hoje é fácil chegar lá, tudo asfaltado, mas nas era assim quando moleque, passávamos pelo Colubandê (não tem nada a ver com macumba, ok? É um bairro) e tínhamos de soltar e empurrar a bicicleta de tanta areia que havia em pontos daquela rua, parecia praia. Outra coisa que fazíamos era andar agarrado em caminhões ou ônibus para poupar energia e ganhar velocidade. Hoje os ônibus nem tem mais como agarrar, pois não tem mais apoio para se subir e era lá que nos segurávamos, uma loucura, não sei como ainda estou aqui. Uma vez ia num dos meus passeios, agarrado num ônibus Boassú (antigamente ônibus não tinha número, tinha nome) e quando estava em frente ao cemitério de SG, agarrado ao mesmo, indo à toda, o motorista, mui carinhosamente, começou a me espremer contra o meio fio da calçada. Não conseguia sair daquela situação e estava vendo que seria esmagado contra um poste que se aproximava rapidamente e joguei a bicicleta  para cima da calçada, num ato de desespero, mas havia um pequeno detalhe, o meio fio que dividia a rua do asfalto, bati nele e voei. Fomos juntos, eu a minha querida bicicleta, como unidos que éramos, capotando, virando e ralando na calçada. Me levantei e fui fazer o balanço dos estragos, minha roda da frente tinha virado um oito e precisei carrega-la nas costas até em casa (não lembro de mim, mas lembro perfeitamente como minha bicicleta ficou). Cheguei em casa e procurei logo consertá-la para novas aventuras que ainda viriam e assim fomos nos divertindo e pagando as prestações (doze, lembram?). Todo mês eu ia na Mesbla em Niterói, onde hoje é a Loja Leader, pagar a prestação. Quando completou um ano a última prestação foi paga, então ela foi roubada.

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