01 janeiro 2012

Short Story XXII - Vigilante


Falar do meu primeiro emprego é complicado, pois trabalho desde que me entendo por gente, seja catando ferro velho, seja vendendo limão na feira, seja trabalhando com meu pai em obras, seja trabalhando com meus irmãos mais velhos como ajudante de mecânico, ajudante de pedreiro, ajudante na gráfica, colaborando na impressão de boletins, ajudante de eletricista, faxineiro de igreja etc então vamos chamar de primeiro emprego com carteira assinada. Perturbava meu pai pedindo para ele me ajudar e ele então me levou a uma floricultura para ser entregador de flores. Usaria um jaleco azul e um triciclo para ir e vir com as muitas flores e entregando-as aos clientes: me recusei (sempre fui metido e magro, tinha 59 quilos e 1,80 m. Até o exército me recusou por falta de peso). Como não aceitei esse, nem o de vendedor de pão na rua, ele então falou para eu esperar fazer dezoito anos que ele teria outra coisa “boa” para eu fazer. Assim, no mesmo dia que fiz meus dezoitão dei entrada na minha carteira de identidade (no passado só com dezoito era possível), recebi um protocolo e voltei ao meu pai que então me levou à empresa, uma empresa de vigilância. Fui apresentado ao amigo de meu pai, entreguei o protocolo da identidade e outros documentos e já fiquei para trabalhar. Os caras me deram um uniforme marrom e bege, um quepe, uma cartucheira, presa a um cinto largo e um trinta e oito ou treizoitão. Nunca tinha visto uma arma na minha vida e minha mão cedeu quando a recebeu, entranhando o peso. Olhei para a bichona e achei meio esquisita, visto estar um pouco enferrujada e velha, mas nunca tinha visto uma, então nada falei e me calei. À noite me levaram para uma casa velha em Icaraí para eu vigiar. Era uma casa antiga e abandonada, ainda com os móveis e um automóvel rabo de peixe em cima de tripés na garagem, pois havia uma briga entre os herdeiros. Peguei o treizoitão e fui para uma velha cadeira que ficava na varanda em frente da casa esperar o dia amanhecer. Demorou para isso acontecer...! e pudesse ir embora para casa...!, mas finalmente amanheceu e fui rendido pelo novo vigilante que me perguntou pela noite, se foi tranquila ou teve alguma ocorrência e aí então fui saber por que aquela arma era meio esquisita e velha. Era comum a bandidagem pular o muro da casa, dar um sacode no vigilante (eu) e levar a arma dele, então davam a pior que tinha para o coitado (eu de novo) e assim minimizar o prejuízo da empresa. Fiquei uns dias vigiando essa casa e fui transferido para outro posto, agora na subestação de energia da Ampla no Alcântara. Lá era legal, eu tinha de abrir e fechar o portão para os caminhões e carros que entravam e saíam, conferir identificações e revistar bolsas e sacolas dos pobres (faxineiros e operários, os chefes saiam direto nos seus carros) e assim ia meu dia. Um dia era feriado e o movimento era muito pequeno e estava meio entediado, então comecei a brincar com minha arma, levantando e abaixando o cão da arma suavemente, quando houve uma grande explosão, caí para trás da cadeira com arma ainda fumegando na mão e desesperado, pois tinha dado o primeiro e até hoje único tiro da minha vida. Procurei um buraco em mim, mas vi que ela tinha passado a centímetros do meu joelho e encravado na parede em frente. Fui expulso da corporação (não sei por quê. Ô vida injusta, sô!). Brincadeirinha. Graças ao amigo do meu pai fui poupado e ainda vigiei (e dormi) muitos outros lugares, um deles foi a antiga sede da Ampla, em frente às Barcas. Nesse posto era eu mais outro vigilante veterano e passávamos a noite dormindo, digo, vigiando, na verdade era um rodízio, enquanto um dormia atrás do balcão o outro ficava “alerta”. Uma noite era minha vez de ficar acordado e ouvi um barulho que parecia vir do andar de cima e era como se alguém estivesse virando uns móveis, tipo, “vrum, vrum, vrum”. Dava um tempo e recomeçava, “vrum, vrum, vrum”. Acordei meu companheiro que ficou também ouvindo e decidimos subir para ver o que era. Íamos como nos filmes, se arrastando lentamente pelo cantinho da parede da escada, arma em punho, ouvindo o barulho e indo ao encontro dele. Chegamos no andar de cima, ele olhou para um lado e para o outro do corredor e nada, então fez sinal para eu segui-lo. Não era ali e decidimos subir mais um andar, pois agora parecia vir de lá o som. Novamente pelo cantinho da parede da escada lentamente, arma em punho e subindo.  De novo, ele olhou para um lado e para o outro, não vendo nada me fez sinal para eu subir. Continuamos atendo ao som e percebemos que ele vinha de uma sala em frente, ao final do longo corredor à esquerda. Fomos lentamente ao encontro dela, ele na frente, eu sempre atrás (hehe) e chegamos a porta. Ficamos um tempo ouvimos ouvindo o som, “vrum, vrum, vrum” e ele decidiu entrar, mas a porta estava trancada, então ele recuou um pouco e deu com o pé na porta, arrombando-a. Quando a porta abriu, devido ao excesso de força, ela bateu na parede atrás da gente, ele se assustou e se virou rapidamente, pensando ser um contra ataque e colocou uma enorme arma na minha cara e eu, “calma, calma! Foi a porta, não atire” (nada fácil lidar com profissionais treinados...!). Continuamos nossa ronda e nada de acharmos a origem do som, quando nos demos conta que o ele vinha da padaria ao lado, era a máquina de pão virando a massa para o padeiro fazer pão.

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